Coração de Jesus como fonte de vida sacramental

O Coração de Jesus é o sinal do amor e da misericórdia de Deus para a humanidade, por esta razão, dizemos que os sacramentos nascem desse Coração. Através dos sacramentos a Igreja nos dá de beber da fonte inesgotável do amor de Deus e proporciona ao pecador mergulhar no abismo insondável, no manancial infinito da misericórdia divina.

 

 

          O prefácio da Solenidade do Sagrado Coração de Jesus diz que de seu lado aberto pela lança, o Cristo crucificado, fez jorrar para a Igreja os sacramentos [1].  Esta afirmação é de certa forma, extraída dos santos padres. Eles afirmam que como da costela de Adão adormecido surge Eva sua esposa, do peito aberto do Cristo esposo, morto na cruz, surge a Igreja pura e sem mancha, esposa do Cordeiro[2], visto saírem sangue e água do lado de Jesus ferido pelo soldado, como certificado de sua morte (cf. Jo 19,34). Esses sinais (sangue e água) são testemunhados na Sagrada Tradição como prefiguração dos sacramentos do batismo – pelo qual se dá a pertença à comunidade eclesial – e, da Eucaristia, o próprio Cristo que alimenta o povo neste deserto enquanto se marcha para o céu. 

          São insondáveis os caminhos do Senhor, um exemplo, é o fato de que mesmo sem necessitar de coisa alguma – Deus é um Ser em si mesmo – por amor cria o ser humano, ou seja, o amor de Deus cria o homem para amar e “decreta elevar os homens à participação da sua vida divina” [3]. O relato bíblico aponta que no início da história, o amor do homem é corrompido pelo mau uso da liberdade concedida por Deus. A consequência desse ato é o afastamento de Deus, mas, nem mesmo com essa ruptura o Senhor desampara a humanidade[4], o Criador espera ansiosamente o regresso da humanidade  para Si.  

          Desde o princípio da existência humana Deus quis a sua salvação. Deus a cria para Ele, “fizeste-nos, Senhor, para Vós e nosso coração está inquieto enquanto não descansar em Vós” [5], essas palavras de Santo Agostinho reverberam a dependência absoluta que a humanidade tem de Deus, ou seja, o amor próprio do homem, não é capaz de lhe dar a felicidade plena, pois essa felicidade só é alcançada no estar com Deus; distanciando-se de Deus o homem perde-se e a única forma de encontrar-se é voltar a Ele para poder voltar a si, isto é, quando o próprio Deus o resgata qual bom pastor que busca sua ovelha. Por esta razão diz o salmista: Senhor, “se eu me perder como uma ovelha, procurai-me” (Sl 119,176). 

 

          Embora a humanidade tenha se afastando de Deus, Ele continuou unido ao seu povo, exemplo disso, é o olhar misericordioso para Israel, escravo do Egito, a aliança que fez com ele e a doação da terra prometida, uma herança dada aos filhos que, de certa forma, haviam se afastado do convívio paterno. Deus perdoa todos os erros cometidos por seu povo e através dos profetas restaura a aliança tantas vezes quebrada. Essa é a História da Salvação, da qual Jesus Cristo é o ponto culminante, maior prova do amor de Deus pelo ser humano (cf. Jo 3,16). Em Jesus Cristo, Deus arma a sua tenda no meio do seu povo, caminha com ele. Jesus é o Verbo do Pai que se fez homem. 

          Enviado pelo Pai, Ele veio ao nosso encontro. Encarnando-se, revelou o rosto misericordioso de Deus por amor e para a salvação dos homens: “Eu sou o caminho, a verdade e a vida, ninguém vai ao Pai senão por mim” (Jo 14,16). Jesus é o caminho que leva ao Pai. A vida de Jesus é a presença de Deus entre os homens. Deus que sente e sofre com os homens vai ao encontro dos mais necessitados. A grande consequência desse amor é a Cruz, mas o amor transcende a Cruz, pois Deus não deixou Jesus entregue à morte; ressuscitado Ele ascende ao céu, mas continua presente na sua Igreja através dos sacramentos que são sinais do amor e da presença de Deus. Os sacramentos tornam-se presentes e atualizam a História da Salvação. Jesus os institui para perpetuar na humanidade a graça divina. 

Sacramento da Confirmação

          O Coração de Jesus é o sinal do amor e da misericórdia de Deus para a humanidade, por esta razão, dizemos que os sacramentos nascem desse Coração. Através dos sacramentos a Igreja nos dá de beber da fonte inesgotável do amor de Deus e proporciona ao pecador mergulhar no abismo insondável, no manancial infinito da misericórdia divina. Bem entendeu isso, o discípulo amado; na sua última noite com o Cristo, encostou o ouvido no peito do mestre (cf. Jo 13,25), ou seja, a Igreja que bebe do mais íntimo do Coração de Jesus, pois este Coração revela as maravilhas do Pai. Para mergulhar nele Jesus nos convida “vinde a mim todos os que estais cansados e sob o peso de vosso fardo e vos darei descanso” (Mt 11, 28). 

Sacramento do Batismo

          Os sacramentos como sinais e presença de Cristo dão aos fiéis a graça de se aliviarem do fardo dos seus pecados e de assumirem um vida nova, vejamos: o Batismo nos lava do pecado original, dá-nos nova vida e agrega-nos como membros da família de Deus; a Crisma fortalece a nossa vida, que tantas vezes foi fragilizada pela ação do pecado, nos dar a plenitude da Graça que recebemos no Batismo; o sacramento da Reconciliação restaura a vida perdida pelo pecado, é o remédio eficaz que cura as nossas feridas, onde experimentamos a misericórdia de Deus;

Sacramento da Unção dos Enfermos

          A Unção dos enfermos confere ao católico uma graça especial para enfrentar as dificuldades próprias de uma doença grave ou velhice, ela gera a vida e não a morte; a Ordem confere poder e graça pelo amor de Cristo aos ministros que atuarão como médicos que proporcionam aos pacientes os remédios sacramentais para a salvação das almas; o Matrimonio santifica a união conjugal, a torna sinal do amor de Cristo pela sua Igreja, é fonte de vida. E a Eucaristia é o centro da vida sacramental da Igreja, não apenas nutre, mas revigora os cristãos unindo-os mais intimamente a Cristo e a Igreja; a Eucaristia é o coração de Jesus.

          Estes sacramentos, embora realizados com atos humanos são, na realidade, a ação de Jesus na sua Igreja.  Eles comunicam-nos o Espirito Santo. Mergulhados nos sacramentos, os cristãos penetram no mais íntimo do Corpo de Cristo, pois, através deles recebemos uma nova dimensão eclesial.

          A Igreja entendeu bem o Coração de Jesus como fonte de todos os sacramentos e o próprio Jesus revelou-se com o seu coração sedento e inflamado de amor pela humanidade. Em 1675 no mosteiro de Paray-le-Monial na França, Jesus apareceu a Margarida Maria Alacoque com o peito aberto e o coração ferido. Segundo a monja visitandina, Jesus apontando o coração com o dedo disse: “eis o coração que tem amado tanto os homens a ponto de nada poupar até exaurir-se e consumir-se para demonstrar-lhes o seu amor” [6]. À humanidade, Jesus faz, quando se revela a santa Margarida, doze promessas, entre as quais: “os pecadores acharão, em meu Coração, o manancial e o oceano infinito de misericórdia.” [7] É certamente impossível um sedento encontrar um manancial e não matar a sede em suas águas límpidas, e Jesus nos diz quem beber da água que Ele dá jamais terá sede (cf. Jo 4,14) e mais “‘se alguém tem sede, venha a mim e beba. Quem crê em mim!’ como diz a Escritura: Do seu interior manarão rios de água viva” (Jo 7,37-38).

          Portanto, o Coração de Jesus é a fonte dos Sacramentos e Eles são os canais que nos levam ao Coração de Jesus e à comunhão de vida com Ele. Coração este que aberto na cruz é a manifestação suprema do amor de Deus que convida aos homens a regressarem ao estado de graça, ou seja, é o próprio Deus que, a partir dos sacramentos propõe a restauração da natureza humana. 

 

Clique aqui para baixar este artigo em PDF

 

 

 

Frei Pedro Félix Rodrigues de Matos, OSA
Religioso na Ordem de Santo Agostinho, graduado em Filosofia pela Faculdade Vicentina (FAVI), PR. Cursa Teologia o 5º semestre no UNISAL

 

 

 

[1] MISSAL ROMANO. São Paulo: Paulus, 1992. p. 383.

[2] Aqui faço menção a um dos padres que fazem essa afirmação: SANTO AGOSTINHO. Comentário ao Salmo 103, Sermão IV, 6.

[3] Cf. CONSTITUIÇÃO DOGMÁTICA LUMEN GENTIUM sobre a Igreja. In: DOCUMENTOS DO CONCÍLIO ECUMÊNICO VATICANO II. São Paulo: Paulus, 1997, n. 2.

[4] Cf. Ibid.

[5] SAN AGUSTÍN. Confesiones, I,1,1. Madrid: Ciudad Nueva, 2003. Tradução nossa.

[6] Descobrir o Sagrado Coração com Margarida Maria, em Paray-le-Monial. São Paulo: Mosteiro da visitação de Santa Maria, 1998. p. 9.

[7] Manual do Coração de Jesus. 92ª. ed. São Paulo: Loyola, 2017. p. 97.

 

Deixe uma resposta

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.

Next Post

O Sagrado Coração de Jesus e o sacerdote

sex jun 19 , 2020
No próximo dia 19 de junho, celebraremos, se Deus quiser, em comunidade, a Solenidade do Sagrado Coração de Jesus (segunda sexta-feira após a solenidade litúrgica da Santíssima Trindade), bem como o dia de santificação dos sacerdotes.

Outros artigos dessa categoria

%d blogueiros gostam disto: